top of page

#11 - Live Commerce

  • Foto do escritor: Thiago Pierozzi
    Thiago Pierozzi
  • 23 de out.
  • 8 min de leitura

Live Commerce: O Fenômeno Chinês que Está Transformando o Varejo Digital Brasileiro


O universo do e-commerce está passando por uma revolução impulsionada pela interatividade e pelo poder de persuasão dos influenciadores digitais: o Live Commerce.


No 11º episódio do "Debate no Café", os anfitriões Thiago Pierozzi e Márcio Oliveira receberam Gabriel Reginatto, cofundador da Alive, uma das principais plataformas de Live Commerce em operação no Brasil, para desvendar essa modalidade que, apesar de ser uma "moda" recente no país, já domina o comércio eletrônico chinês.


A Live Commerce é definida como uma experiência de compra onde as vendas são realizadas através de uma transmissão ao vivo pela internet. Embora se possa traçar um paralelo com o antigo formato de teleshopping (como o Polishop), Reginatto garante que a Live Commerce é algo similar, mas "muito melhor" e impulsionada por forças modernas, como mídias sociais e interatividade.


A Trajetória de Gabriel Reginatto: Da Finança a Xangai e o Ecossistema Alibaba


Gabriel Reginatto possui mais de 15 anos de experiência em Finanças. Sua imersão no Live Commerce ocorreu durante o período em que morou na China e trabalhou dentro do ecossistema do Alibaba. Ele teve o privilégio de "ver o Live Commerce nascer lá na China e se popularizar", trazendo para o Brasil uma experiência diferenciada em Live Commerce e digital branding. Reginatto é hoje um dos fundadores da Live, plataforma estabelecida no Brasil no meio da pandemia.

Sua mudança para Xangai em 2017 foi um choque cultural e de experiência. Reginatto relatou a sensação "muito humble" de andar na rua e não entender nada das placas. Ele enfatizou que "viver a vida como um chinês" — usando os aplicativos de consumo e e-commerce — é algo muito diferente do que apenas visitar o país.

Sua experiência se aprofundou quando ele passou a trabalhar em uma empresa de e-commerce de leite ligada ao Alibaba, o que lhe deu a oportunidade de visitar o Alibaba várias vezes e gerenciar lojas de marcas que vendiam nos marketplaces do gigante chinês.


O E-commerce Chinês: Viciante e Cativante

Márcio Oliveira destacou que a China, como motor da economia mundial e um espetáculo de inovação no e-commerce, é um grande exemplo, e perguntou a Reginatto sobre a distância entre essa realidade e o Brasil.

Reginatto ilustrou a diferença através de uma anedota pessoal envolvendo sua esposa, uma grande consumidora de e-commerce (fã da Amazon). Ao chegar na China, ela se deparou com aplicativos chineses (como o Taobao e Jingdong), sem opção em inglês, descrevendo a interface como "uma confusão de foto, vídeo, letra". Dois anos depois, ao retornar ao Brasil e tentar usar plataformas ocidentais (como o Mercado Livre), ela reclamou que "isso aqui não tem nada, muito ruim", sentindo falta da riqueza de conteúdo do Taobao. Essa experiência demonstra como o ser humano é adaptável e, principalmente, como o e-commerce chinês é feito de forma diferente, sendo "muito mais viciante, muito mais cativante em vários aspectos" do que o modelo ocidental.


A Origem do Fenômeno e o Poder da Conversão (10x Maior)


A Live Commerce começou a ganhar tração quando o pessoal do Alibaba começou a incentivar todos os sellers a fazerem Lives para vender. Reginatto, que inicialmente gerenciava essas contas, ficou chocado com a performance. Um relatório revelou que a taxa de conversão estava "mais de 10 vezes maior do que a da loja normal". Ele precisou assistir às Lives para entender o ecossistema.


O formato chinês, geralmente, envolve uma influenciadora (Key Opinion Leader - KOL) que é expert em uma categoria específica (esportes, maternidade, yoga, nutrição, etc.), apresentando produtos de várias marcas. Essa curadoria é levada "muito a sério".

Reginatto compartilhou um exemplo marcante dessa curadoria estrita: ele tentou vender produtos de clientes (uma marca italiana) na Live de uma influenciadora, mas foi negado. A influenciadora questionou: "Você acha que eu vou botar um produto que tem quatro meses de mercado na minha Live? [...] Eu nunca usei". Ela só aceitaria a proposta após um ano de mercado, garantindo que o produto fosse bom. Essa atitude ressalta a importância da confiança, pois as influenciadoras se veem como "donas das lojas" e zelam pela sua reputação.


Na Live, a interatividade é muito grande, impulsionada por diversas "ferramentas de gatilhos de call to action". Diferente do antigo "Ligue Já" do teleshopping, a Live Commerce utiliza cupons piscando, sorteios participativos com cliques na tela, e incentivos como "compartilhe para 5 amigos e ganhe desconto", criando uma série de mecanismos para estimular a compra por impulso.


E-commerce Racional vs. Live Commerce Emocional


A razão do sucesso na conversão reside na natureza da Live Commerce. Reginatto explica que o e-commerce tradicional é "muito racional". O consumidor pesquisa, lê reviews ("os cinco melhores furadeiras de 2021"), adiciona ao carrinho, mas muitas vezes abandona a compra, pois há "fricção" no processo.


Em contraste, o Live Commerce é "emocional". Ninguém acessa a Live Commerce pensando racionalmente na compra de um produto específico. Eles veem o influenciador, um especialista de confiança, dizendo que o produto é bom, e compram por impulso. "É por isso que você tem a performance de conversão mais alta do que o e-commerce tradicional," resume Reginatto.


Embora o Live Commerce lembre o Polishop, ele é uma "versão repaginada" e é "dirigido por outras forças modernas" que não existiam antes, como mídias sociais, influenciadores e interatividade.


A Transformação dos Influenciadores na China


Márcio Oliveira levantou o ponto de que, no Brasil, muitos influenciadores se comportam mais como celebridades ou garotos-propaganda, fazendo publipost e mantendo uma certa neutralidade em seus canais. Reginatto concorda que os mercados estão em níveis de maturidade diferente.

Ele notou que, antes do Live Commerce, o mercado chinês era similar ao brasileiro, com influenciadores focados em patrocínios. O Live Commerce surgiu como uma alternativa, inicialmente abraçada por novos influenciadores com um perfil mais comercial e pioneiro.


A chave da mudança foi a forma de monetização: "A forma de monetização do Live Commerce é por percentual de venda". Esses influenciadores, ao invés de apenas promoverem, tornaram-se "lojas enormes".

Figuras como Li Jiaqi (que vendia batom e maquiagem) e Wei Ya (que vendia Avon), que eram pessoas normais, empreendedores sem fama, conseguiram se tornar superstars e multimilionários. Li Jiaqi, um dos Top 3 da China, chegou a vender o equivalente a 10 bilhões de reais em um único dia de Live.


O sucesso financeiro desses vendedores gigantes chamou a atenção dos influenciadores tradicionais. Eles perceberam que estavam ganhando muito mais dinheiro e iniciaram uma migração: do publipost para abrir suas próprias lojas, fazer a curadoria e ganhar suas comissões, gerando um efeito cascata. Em 2019, até mesmo celebridades do alto escalão de Hollywood chinesa (o equivalente ao Brad Pitt) começaram a fazer Lives de venda, faturando milhões de dólares.


Na China, isso criou um novo sonho: "Lá na China, os chineses criam... eu quero ser vendedor de Live".


O Cenário Brasileiro: Potencial Imenso e Fases de Adaptação


Reginatto reforçou que, embora o mercado brasileiro não esteja no mesmo nível de maturidade, é uma questão de tempo até que o movimento se consolide. Ele citou pesquisas que apontam o Brasil como o primeiro país do mundo em intenção de compra de produtos oferecidos por influenciadores, à frente até mesmo da China e da Índia. Este fato "ratifica o que a gente já sabia".


Atualmente, o Live Commerce no Brasil está na chamada "fase 1", que consiste nas "marcas do varejo fazendo as suas Lives". A Alive (plataforma de Reginatto) já atende clientes grandes, como Casas Bahia (com Lives semanais) e iFood. Nesses casos, a Live é feita pela própria marca/varejista, que ocasionalmente convida um influenciador ou usa seus próprios vendedores talentosos.


A "segunda fase" é o ponto de inflexão e a "grande revolução do negócio". Esta será a fase em que a "influenciadora vai ter uma loja". Os seguidores, que confiam no especialista, buscarão o que "Fulano tá usando". Nesse ponto, "quando você tá falando de comprar da do fulano de tal, aí mudou, né? Você teve aí uma fragmentação e descentralização do poder de convencimento". Por enquanto, estamos em uma mudança de interface; "a mudança do modelo vai vir em breve".


O Modelo de Negócio Descentralizado


Thiago Pierozzi questionou Gabriel sobre a logística por trás dessa loja do influenciador: ele precisaria ter estoque, meio de pagamento próprio?.

A resposta é que, no modelo da plataforma Live, o influenciador não precisa se preocupar com logística. "Ele não vai precisar ter estoque, ele não vai precisar ter contato com o cliente". O influenciador precisa apenas escolher o que vender, ser credenciado pela marca e focar em sua competência principal: "ser bom de skills que interage com o público e de chamar pessoas para comprar os produtos".


Esse modelo descentralizado se alinha ao sucesso das vendas diretas no Brasil. O Brasil é um dos maiores países do mundo em venda direta, com cerca de 5 milhões de vendedores formais (e 8 milhões se contarmos os informais). Este conceito, onde uma pessoa de confiança recomenda e vende (como no modelo Tupperware), está sendo potencializado pela tecnologia para todos os mercados.

Márcio Oliveira também mencionou o Pinduoduo, marketplace chinês, onde se vê um Direct to Consumer extremo: um agricultor fazendo Live Commerce da sua fazenda, vendendo couves diretamente para o consumidor final.


A Diferença Cultural e a Confiança do Seller


Reginatto traçou uma distinção crucial entre os marketplaces ocidentais (como o americano ou brasileiro) e o chinês (Alibaba).

Marketplaces Ocidentais: Focam primariamente no consumidor final, tratando o seller (a marca) como um by proxy. As lojas não podem ser customizadas, e muitas vezes o marketplace copia o produto e vende mais barato, prejudicando a marca. A solução ocidental para as marcas é ter seu "lugar próprio," o que impulsiona o crescimento de plataformas como a Shopify.


Marketplaces Chineses (Alibaba): A missão é ajudar os sellers e as marcas. Eles dão liberdade para que as marcas customizem suas lojas (com vídeo atrás, "neblina caindo," etc.) para que se destaquem e o produto não seja comoditizado. Segundo Reginatto, essa necessidade de ter uma plataforma separada (como a Shopify) não existe na China.


A confiança foi um fator primordial para o surgimento do Live Commerce na China. O povo chinês começou a não mais acreditar nos reviews dos marketplaces, que eram infestados por fake reviews. "O pessoal começou a não acreditar mais nos reviews que tinham nos marketplaces," diz Reginatto. Como resultado, os consumidores migraram para a pessoa em quem confiam (a influenciadora). Eles preferem comprar na loja da Wei Ya, por exemplo, porque "ela só bota o que é bom na loja dela".


O Futuro do Live Commerce no Brasil


O Brasil se encontra no "precipício da mudança". Gabriel Reginatto acredita que 2021 já está vendo marcas grandes fazendo incursões nesses novos modelos, mas que "ano que vem vai ser o ano que vai consolidar aí uma série de mudanças interessantes".


O potencial é imenso, pois se trata de um "mercado assim azul," onde não é comum ver uma tendência prestes a surgir com poucos players ainda se movimentando. Reginatto reforçou a tese de que trabalhar em nichos na internet é uma das melhores soluções, garantindo um espaço e um sucesso mais certeiro. Thiago Pierozzi inclusive mencionou o potencial para o próprio "Debate no Café" de usar o formato Live Commerce para vender produtos nichados, como café, diretamente para o consumidor final.


O debate entre a centralização (grandes varejistas/marketplaces) e a descentralização (influenciadores/lojas próprias) está ativo. Reginatto notou que, como o e-commerce brasileiro ainda é pequeno em relação ao varejo total, há muito espaço para crescimento e "muito bolo para dividir ainda". O Live Commerce representa um canal adicional de venda para as marcas e uma melhor forma de se conectar com o consumidor final.



Se você gostou deste debate, convidamos você a se inscrever no Debate no Café no LinkedIn, no YouTube e no Spotify. Deixe seus comentários sobre o episódio e compartilhe este conteúdo com sua rede. Sua interação e compartilhamento ajudam muito o nosso canal a crescer. Além disso, você pode recomendar convidados para participar dos próximos debates, clicando no link disponível no nosso site.



Comentários


©Debate no Café

desde 2021

bottom of page